ILUSÃO DE ÓTICA (Clarice Lispector)
ILUSÃO DE ÓTICA (Clarice Lispector)
Como se fosse o brilho dum clarão,
no escuro da imensidão que não existe;
como se fosse trégua,
numa colheita-lide que por ora não persiste;
como se fosse breu,
tomado de forma sensata dum jeito que não se permite;
como se fosse sede,
vingada em verdades à um copo d'água que sorri triste;
como se fosse o grito em campanha,
que nada à linha segue, contesta, reclama, ama, resiste;
... meus olhos beijaram tua boca, Clarice,
... meus dedos sentiram teu gosto, Clarice,
- completamente apaixonado, mesmo ao fedor do cigarro -
pensando que te via e te entendia,
no contexto do tédio que vara a noite,
e persegue o dia.
E eu sendo um pouco de ti (eu sei), conclamo,
amém,
e tu nada sendo pra mim (eu sei),
e pra ninguém,
é na leitura de livros, que como e me farto a um banquete de festa de fim-de-ano.
Mas vendo eu tua morte que ia,
por desengano,
(sem mesmo ao tempo de conhecê-la)
saindo do teu próprio corpo, em riste,
sorria,
e você 'penas sem dar tchau, séria, com apatia,
partia.
Loucuras à parte, eu sei que te amo, Clarice.
Porque assim decidi, um dia,
ser e sentir, você.
obs: poesia feita em homenagem ao quase centenário de Clarice Lispector. Nada mais preciso dizer. Nada mais preciso explicar. Se-lhe toco ...
Antonio Jadel
Enviado por Antonio Jadel em 23/12/2019